Por Renata Tomaz
Quando meu filho voltou do cinema, onde tinha ido assistir à animação Cada um na sua casa, produção da Dreamworks de 2015, questionei se tinha gostado do filme. Diante da resposta afirmativa, perguntei qual tinha sido a melhor parte, ao que ele respondeu: “A menina do filme é preta igual a gente e tem um cabelo igual ao seu, mamãe”. Fiquei muito orgulhosa por descobrir que todo prestígio da protagonista Tip, dublada pela cantora Rihanna, estava no fato de ela se parecer comigo. Mas a resposta do meu filho, então com 5 anos, produziu em mim mais do que vaidade. Ela mostrou que, mesmo tão pequeno, ele já sabia que representatividade importa. E muito!
Ver-se e reconhecer-se no outro amplia nosso senso de existência, ao nos conferir pertencimento. Trata-se de algo muito básico, encontrado até mesmo na literatura clássica infantil do século XIX. O patinho feio, conto de Hans Christian Andersen, de 1843, narra a história de um cisne que sempre se sentiu desqualificado porque não se parecia com o restante de sua comunidade. No entanto, quando ele atestou a existência de outros como ele, construiu uma identidade capaz de assegurar-lhe que não se trata de ser feio ou bonito, mas de pertencer a um lugar. Esse é o poder das representações.
Foi olhando para as representações dos “diferentes”, na Inglaterra, que Stuart Hall, o sociólogo jamaicano que eu julgava ser branco até ver uma foto dele na contracapa de um livro, desenvolveu um importante arsenal teórico para estudar a produção de sentido. Suas contribuições nos permitem observar, por exemplo, o comportamento das mídias e identificar que dinâmicas de pertencimento estão sendo criadas e reproduzidas, a partir das representações. É porque tais dinâmicas têm sido problematizadas que podemos falar cada vez mais em representatividade e em mecanismos de sua promoção.
Disso tratam os textos apresentados nesta coletânea do Blog do Laccops, oferecendo diferentes perspectivas sobre a representatividade da negritude. Em O racismo que ninguém vê, Debora Restum aborda as teatralidades como um caminho para o reenquadramento do racismo em diferentes situações, através de uma ação na rede de escolas municipais do Rio de Janeiro. As diferentes instalações cênicas levaram ao cotidiano escolar possibilidades diversas de abordar o assunto. O fotógrafo Rodolfo Viana escreveu O trabalho – abrindo a caixa-preta da fotografia e da arte. Trata-se de uma imersão em uma exposição que vai além da exibição do trabalho de artistas negros, mas sai em busca de suas referências.
No texto Representatividades, Thi Gresa fala a partir de seu lugar de performer para nos propor pensar a representatividade como um encontro, que consiste em superar seu caráter identificatório e atingir, assim, a possibilidade de troca. O mestrando em comunicação e cultura Evandro Luiz da Conceição toma a produção audiovisual como tema central em Representatividade: a parte que nos cabe no lugar da invisibilidade. Por fim, deslocando-nos das artes para a mídia, Diego Cotta, doutorando em mídia e cotidiano, apresenta Representação e representatividades da negritude na mídia. Ele problematiza a questão, ao mostrar que tão importante quanto o número de negros e negras na produção midiática é o modo como têm sido representados.
Sobre a autora: Renata Tomaz
Pós-doutoranda, com Bolsa Capes, no Programa de Pós-graduação em Mídia e Cotidiano (PPGMC), na Universidade Federal Fluminense (UFF), onde atuou como professora substituta do Departamento de Estudos Culturais e Mídia (2018-2019). Realizou doutorado (2017) em Comunicação e Cultura, na linha de pesquisa Mídia e Mediações Socioculturais, com Bolsa Faperj Aluno Nota 10, na Universidade Federal do Rio de Janeiro, mesma instituição em que concluiu o mestrado (2011), com Bolsa Capes, e a graduação em Jornalismo (2004). Pesquisadora integrante do Núcleo de Estudos de Mídia, Emoções e Sociabilidade (NEMES) e do grupo de pesquisa Ética na Sociedade de Consumo (ESC), ambos inscritos no CNPq. Editora da revista Mídia e Cotidiano, baseada no PPGMC, e editora associada da revista DESidades, vinculada ao Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para Infância e Adolescência (Nipiac), do Instituto de Psicologia da UFRJ. Vencedora do Prêmio Eduardo Peñuela 2018, concedido pela Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Comunicação (Compós), na categoria Melhor Tese de Doutorado. Vencedora do Prêmio Freitas Nobre 2016, concedido pela Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom). Autora dos livros "Da negação da infância à invenção dos tweens: imperativos de autonomia na sociedade contemporânea" (Appris) e "O que você vai ser antes de crescer? Youtubers, Infância e Celebridades" (EdUFBA). Tem experiência profissional em jornalismo impresso, on-line e eletrônico. Os interesses de pesquisa se concentram nas áreas de mídia, infância, juventude, subjetividades contemporâneas, culturas digitais, maternidade e redes sociais.
Comentarios