por Thi Gresa,pessoa não binárie, performer, e professore de artes
Eu nunca sei como começar meus textos, o que eu sei é do que eu quero falar, e aqui, quando falo, falamos. Então, que seja falado sobre as possibilidades de habitar o mundo, mas mais do que as possibilidades de habitar o mundo, as possibilidades impossíveis de se habitar o mundo, e o desejo, a pulsação e a explosão escalafobética de se estar em constante jogo com aquele mundo que se faz, refaz, constrói, destrói e cria-se na mesma dimensão, velocidade, prazer e circunstâncias que se dá o trânsito dos corpos dissidentes de gênero, e principalmente, os dissonantes estéticos.
Devido ao foco do texto, e o foco ao qual ele se destina não vou aqui me ater à longa discussão do que venho chamando há alguns anos de dissonâncias estéticas. A ideia parte de uma experiência estética relacionada a arte da performance, que desde a minha formação em Artes do Corpo, venho pesquisando, como as existências que possibilitam um novo/inversão da lógica do olhar, da escuta e ampliação dos sentidos, para que possamos inclusive descobrir novas formas de estar juntes e nos relacionar.
E ainda mais, que possamos descobrir outros sentidos do corpo para construir novas formas de se comunicar, estar no mundo, na borda e nos trânsitos. Aliás, como diz Antonio Manuel no texto “Ondas do corpo”, referindo-se diretamente às performances de Hélio Oiticica, “a descoberta do corpo como estrutura sensorial, inexplorada, com manancial inalienável. q conduziria à estruturação do que chama O NOVO COMO INVENÇÃO” e ainda mais adiante, “as experiências e a invocação experimental envolvendo o corpo sempre hão de aparecer e reaparecer de novos modos: tantos quantos seriam os indivíduos a experimentá-las”. É justamente com a invenção, com os novos modos de experimentação que vamos descobrir esses caminhos e os percursos dos trânsitos para criarmos as travessias que nos possibilitaram os encontros.
Bem, aqui temos a provocação para proporcionar uma reflexão sobre a ideia de representatividade. A tentativa aqui é a de fugir e ampliar as percepções, inventando e recriando novas perspectivas que caminham em paralelo com a ideia de representatividade, ou ainda, que atravessem as políticas das representatividades.
Vou levar como suposição neste decorrer do texto que todes que estão se debruçando a ler essa publicação, compreendem a importância da representatividade em todos os campos da nossa sociedade. Mas ainda mais, que compreendem também a importância da pluralidade das representatividades, que todas estejam, como a própria idéia da palavra diz, representadas nos ambientes da sociedade.
Com isso posto, eu quero dar um passo adiante, e falar de algo que a representatividade proporciona e que a minha ideia, enquanto artista, potencializa as noções do que aqui estamos tentando formular. A ideia de encontro.
Mais do que a identificação com o outro que é “igual” a você, a representatividade transcende o reconhecimento, e possibilita o evento do encontro, da troca, da emancipação. Ainda mais, constrói coletivamente formas de existências, formas de criação de novas formas de sentido, amplia as manifestações dos sentidos. O corpo vibra, a existência se expande, e as invenções deixam-se o campo da identificação/reconhecimento e passam para o campo prático da performance, da invenção subjetiva, singular e plural.
Práticas da performance do encontro. Práticas indisciplinares, poéticas e, políticas das possibilidades inventivas contra hegemônicas. E contra hegemônico é também as possibilidades impossíveis de existirem, existirem!
Lembro-me imediatamente e pego à minha estante o livro de Castiel Vitorino Brasileiro - que encontrei em Cachoeira em novembro de 2019 -, e logo após a abertura, atentamente identifica-se algumas chaves importante, em primeiro lugar a questão “quando encontro vocês”, e o encontro por meio das fronteiras, e do mesmo modo, ela cria e recria o seu corpo a partir de imagens de encontros consigo e com as suas ancestralidades.
Sequencialmente, ao final, novamente ela levanta a questão do encontro conosco, com a materialidade, a imaterialidade e as possibilidades impossíveis de existirem, e finaliza, “somos filamentos dos mistérios que possibilitam nossas vidas nessas relações”.
Não me demorando a finalizar o texto, as reflexões e as provocações, tendo a questionar as possibilidades inventivas dos trânsitos, bordas e invenções do que podemos criar com a representatividade. Utilizando-a como propulsora, como impulsionadora dos encontros, por que como diz os dois textos citados aqui, o encontro e a invenção são os caminhos, trânsito e percursos que nos levam as práticas da performance, e mais do que isso, nos levam ao encontro, e mais do que identificar, encontrar Vivas. Vivos. Vives.
Imagem: Julia Leli
sobre a autora:
Thi. Gresa é pessoa não binárie, performer, e professore de artes. Formade pela PUC e mestre pela UERJ. Pesquisa questões relacionadas à performance, gênero, estéticas dissidentes e dissonantes
contato: a.thigresa@gmail.com
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